segunda-feira, 25 de julho de 2016

Um mundo de Alice.





        A peça começaria às 20 horas, então chegou pontualmente às 17.  Decidiu que naquele dia em especial iria com o cabelo negro solto em cascata pelos ombros, e a bolsa seria amarela para combinar com os sapatos novos e o vestido. Foi ao café primeiro, deliciou-se com um cappuccino e um pão de queijo. Depois ao museu, deliciou-se com a arte contemporânea e pós-moderna. Depois ao teatro, quase atrasada olhava de segundo em segundo o relógio no pulso, queria sentar-se na primeira fileira, milimetricamente no centro da plateia.
        Com passos certeiros o espetáculo começava. A excitação crescia, ofegava de leve esperando a beleza do cenário e do figurino, a melodia suave vibrando no coração pulsante, sentia que essa seria uma apresentação diferente, que romperia com as muitas críticas que criava, levando-a por novos destinos.
Seria uma releitura de Alice no País das Maravilhas, e ela, também chamando-se Alice, nunca perdia uma oportunidade de apreciar a personagem preferida, a qual acompanhava desde os dez anos de idade e que se assemelhava em toda a loucura que guardava apenas para si.
       Absorvida nos olhos azuis da protagonista e no vestido cor de esmeralda, perdeu-se em um momento. Desbravou junto a ela os temores de viver numa mágica toca-de-coelho, repleta de criaturas assustadoras e mudando a cada instante. Permitiu que uma lágrima lhe caísse na face no momento em dizia não saber quem era, pois já havia sido tantas. A Alice da plateia era tantas quanto a do palco, sentia-se tantas, sabia-se tantas. Era muito mais que apenas um nome.
        Concentrada, delirante, nossa protagonista de cabelos negros perdeu o ar. Num segundo, num rompante, o gato risonho surgiu na cena e se aproximou da ponta do palco, ajoelhando-se e lhe entregando uma rosa. Nos olhos verdes do homem maquiado, ela se entregou pela primeira vez a uma paixão pelo personagem, pelo ator, pela profundida da emoção. De uma vez só, sem pedir licença, sentiu-se tragada com toda a força junto ao oceano da alma dele.

       Num simples olhar, num paraíso intocável pela distância das dimensões, ela era real e ele inalcançável. Afinal fora realmente seduzida, e sentindo o perfume da rosa, desconfiava-se quase inteira, suspirando por um sorriso forasteiro que a guiava pelo país das maravilhas.

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